Proibido no Brasil, amianto continua matando em Goiás

A cidade de Minaçu, no Norte de Goiás, abriga a única mina de amianto ainda em funcionamento no país. O minério está proibido no Brasil desde 2017, em razão das várias doenças fatais que provoca, como a asbestose, que tem latência longa e é incurável. Em 2019, porém, o governador Ronaldo Caiado (União Brasil) sancionou uma polêmica lei estadual autorizando que o amianto continuasse a ser extraído no estado de Goiás “exclusivamente para exportação”.

A lei goiana foi contestada três dias depois de entrar em vigor. No dia 19 de julho de 2019, a Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho (ANPT) protocolou no STF uma ação contra o texto sancionado por Caiado. “A lei é uma tentativa de burlar a proibição do amianto”, afirma o advogado Gustavo Ramos, que representa a ANTP nas audiências sobre a ação.

Três meses depois da ação ser protocolada, o então procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu a suspensão imediata da lei goiana. Mas o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, não concordou com o procurador quando apresentou seu voto, mais de três anos depois.

Na primeira tentativa de julgamento, em junho de 2023, Moraes reconheceu que a lei goiana contraria a Constituição, mas foi contra sua suspensão imediata. Ele afirmou que era preciso “assegurar prazo razoável para a finalização segura das atividades” da mina e votou para que a proibição só tivesse efeito um ano depois. Foi nessa sessão do plenário virtual do STF – no qual os ministros apresentam seus votos por escrito, sem se encontrarem em uma audiência – que Gilmar Mendes pediu vista e paralisou o julgamento. Menos de uma semana antes, ele se reunira com Caiado em Goiânia, onde foi fazer uma palestra.

Apesar do pedido de vista do colega, a então ministra Rosa Weber, que se aposentaria naquele mesmo ano, antecipou seu voto, endossou a inconstitucionalidade da lei e defendeu sua suspensão imediata. Estava sendo coerente com a postura que adotara seis anos antes, ao sustentar com firmeza a proibição do amianto no país.

O STF marcou finalmente para o dia 14 de agosto de 2024 o reinício do julgamento do caso, dessa vez no plenário presencial. Mais tarde, desmarcou a sessão sem dar explicação, frustrando ativistas antiamianto que haviam viajado a Brasília para acompanhar o julgamento. Um dia depois, em 15 de agosto, o governo de Caiado protocolou na Assembleia Legislativa de Goiás o projeto de uma nova lei para a mineração do amianto.

A lei aprovada por ele em 2019 não tinha prazo para o fechamento da mina e previa seu funcionamento “enquanto houver capacidade de extração de lavra ou disponibilidade do minério”. Diante do avanço no STF da tese da inconstitucionalidade, o novo projeto de lei previa um prazo máximo de cinco anos para a exploração – e, no mesmo dia em que foi protocolado, passou por uma comissão e teve aprovação no plenário da Assembleia goiana.

O novo texto tem uma pegadinha e uma surpresa. A pegadinha é que o prazo de cinco anos só vai ser contado a partir da assinatura de um termo de compromisso entre o governo de Goiás e a Sama Minerações Ltda, que administra a mina. Ou seja, na prática esse prazo pode ser estendido pelas duas partes interessadas na manutenção da extração do amianto.

A surpresa é que o texto da nova lei determina que a dona da mina apresente um plano estratégico para o pós-encerramento das atividades, com monitoramento ambiental da área explorada e acompanhamento da saúde dos trabalhadores. A Sama também administrava a mina de amianto em Bom Jesus da Serra, no sudoeste baiano. Desativada há quase sete décadas, a mina deixou grande parte do minério a céu aberto e um rastro de trabalhadores contaminados sem assistência.

Até agora, o STF não julgou a ação que pleiteia o fechamento da mina em Minaçu. Se o tivesse feito, moradores que morreram de doenças provocadas pelo amianto nos últimos seis anos teriam sido salvos. O demorado trâmite da ação no Supremo permitiu que outros trabalhadores seguissem sendo contaminados.

A manutenção da mina é rentável para o governo de Caiado. De janeiro de 2019 a julho deste ano, a Sama destinou 56,5 milhões de reais à Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), assim distribuídos: 60% para o município, 15% para o estado de Goiás, 10% à União e o restante para outros municípios afetados pela mineração. O Brasil é o terceiro maior produtor de amianto do mundo, depois da Rússia e do Cazaquistão. Nos últimos seis anos, o minério de Minaçu seguiu para dezessete países, sendo os asiáticos os maiores clientes.

Assinantes da piauí podem ler a íntegra da reportagem neste link.



Piauí Folha

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