Família que mora há 12 anos em imóvel no Recife quase perde moradia após leilão por dívida do antigo dono
Uma família que reside há mais de uma década em um apartamento localizado no Edifício Pirapama, na Avenida Conde da Boa Vista, no centro do Recife (PE), foi surpreendida ao descobrir que o imóvel onde vivem estava prestes a ser leiloado devido a dívidas de condomínio deixadas pelo antigo proprietário. A situação só chegou ao conhecimento dos moradores por meio de uma vizinha, já que eles não haviam sido oficialmente notificados sobre o processo judicial.
Diante do risco iminente de perder a moradia, a família recorreu à Defensoria Pública de Pernambuco (DPPE), que entrou com um recurso de caráter urgente para suspender a venda judicial do imóvel. A decisão da Justiça garantiu a suspensão imediata do leilão, que estava marcado para o dia 8 de julho de 2025, protegendo a família de perder o local onde vive há mais de 12 anos.
O defensor público Thiago Pinheiro Di Rico, coordenador do Núcleo Cível da Capital, explicou que a dívida condominial, que motivou a execução e o leilão do imóvel, é de responsabilidade dos herdeiros do antigo dono do apartamento, e não dos moradores atuais. Ele ressaltou que os moradores exerceram a posse do imóvel de forma “mansa, pacífica e contínua”, com a intenção de serem proprietários (animus domini), característica fundamental para a obtenção do direito à usucapião.
Além disso, o defensor explicou que a família investiu no imóvel realizando diversas melhorias e benfeitorias ao longo dos anos. Quando eles ocuparam o apartamento, ele estava em condições precárias, abandonado e deteriorado, o que reforça o caráter legítimo da posse e o vínculo afetivo que desenvolveram com o imóvel.
O imóvel foi indicado pelo inventariante do espólio do antigo proprietário como garantia para a penhora judicial, dando início ao processo de leilão sem qualquer comunicação aos moradores atuais, que, na prática, são terceiros interessados no processo e não partes diretamente envolvidas. Esse detalhe é importante, pois a ausência de notificação oficial configurou um problema processual que favoreceu a concessão da liminar de suspensão do leilão.
A Defensoria Pública também ajuizou uma ação de usucapião para garantir que a posse prolongada e as benfeitorias realizadas pela família sejam reconhecidas legalmente, buscando a declaração formal da propriedade do imóvel em favor dos moradores atuais.
Em sua decisão, a juíza Maria Rosa Vieira Santos destacou a importância do direito à moradia digna e o valor afetivo que o imóvel representa para a família, ressaltando que a posse legítima exercida pela família deve ser protegida para evitar “dano irreparável”. A magistrada reforçou que a moradia não é apenas um bem material, mas um espaço de convivência e afeto, fundamental para a dignidade humana.
O caso serve como exemplo da aplicação da teoria da função social da posse, prevista no Código Civil brasileiro, que valoriza a ocupação produtiva e pacífica de um imóvel, principalmente quando este se encontra abandonado e sem reivindicação dos antigos proprietários. Essa teoria busca garantir que o imóvel cumpra sua função social, evitando que bens fiquem ociosos enquanto pessoas constroem vidas e vínculos no local.
Para a família, a conquista do direito à moradia vai muito além da posse legal: representa uma construção de vida, história e afeto no imóvel onde investiram tempo, recursos e amor.
Essa situação evidencia também os desafios enfrentados por famílias que moram em imóveis que passaram por processos judiciais sem seu conhecimento e reforça a importância de mecanismos jurídicos como os Embargos de Terceiro e a usucapião para garantir a segurança da posse e o direito à moradia.